No quadro Correspondente Médico, Fernando Gomes falou sobre estudo da Unesp que identificou proteína na jararacuçu que pode conter em até 75% replicação do vírus
Na edição de quinta-feira (26) do quadro Correspondente Médico, do Novo Dia, o neurocirurgião Fernando Gomes falou sobre o estudo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) que descobriu uma substância em um veneno de cobra capaz de conter a reprodução do coronavírus.
O médico lembrou que, na medicina, grande parte de tratamentos das doenças utilizam substância da natureza, incluindo extratos de plantas e até mesmo o veneno de cobras.
“Em São Paulo, tem a Ilha de Queimada Grande, em Itanhaém, onde temos a jararaca-ilhoa, que tem veneno com a capacidade de se controlar a pressão arterial e é utilizado em medicamentos ao redor do mundo”, contou Gomes.
“[A proteína descoberta] é capaz de inibir a replicação do vírus em pelo menos 75%, o que é uma grande vantagem, pois ainda não temos um remédio específico para tratar o coronavírus”, disse.
“Se houver um medicamento disponível que eu possa oferecer para o paciente que está infectado e dá tempo adicional para que o sistema imunológico possa reagir, produzir anticorpos e as células possam combater de forma mais eficiente, talvez a gente esteja diante de substância decisiva no controle dessa doença”, apontou Fernando Gomes.
Entenda como funciona a ação do pedaço de proteína
Ao infectar uma pessoa, o SARS-CoV-2, vírus causador da Covid-19, invade as células humanas e inicia um processo de multiplicação. As inúmeras cópias do microrganismo repetem o mecanismo, com o objetivo de se disseminar. Um fármaco capaz de bloquear esse processo pode ter um impacto relevante na redução dos danos ao organismo, como as lesões provocadas nos tecidos dos pulmões e demais órgãos do sistema respiratório.
Para verificar a ação do pedaço de proteína (peptídeo), os pesquisadores utilizaram células de macaco cultivadas em laboratório. Os experimentos foram divididos em dois grupos: metade das células recebeu o peptídeo. Após um período de dois dias, os cientistas avaliaram a capacidade de replicação viral nos dois grupos de amostras. Os resultados mostraram que a molécula inibiu em 75% a multiplicação do vírus nas células de macaco.
“É importante deixar claro que não é uma molécula do veneno, ela foi inspirada no veneno. O veneno da cobra tem várias toxinas. Nós pegamos uma delas e estudamos a atividade de partes dessa toxina. Nosso trabalho sintetiza parte dessa toxina que foi extraída do veneno da jararacuçu, não é o veneno em si”, explica o pesquisador Eduardo Maffud Cilli, professor do Instituto de Química e um dos autores do estudo.
No Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP, os pesquisadores reproduziram uma das enzimas essenciais para a multiplicação viral, chamada PLPro. A molécula é necessária para processar as enzimas do vírus e montar uma partícula viral madura, que faz parte do processo de replicação.
“Conseguimos produzir essa enzima em laboratório e testamos a inibição da molécula nela. Vimos que a molécula foi capaz de inibir a ação da enzima. Esse é um dos mecanismos de ação da molécula sobre o vírus. Precisamos avaliar se há outros”, disse Eduardo.
Os testes da ação do peptídeo contra o novo coronavírus foram conduzidos no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, em São Paulo, onde uma amostra do coronavírus está isolada. Segundo Eduardo, os próximos passos da pesquisa incluem a fase pré-clínica, que envolve o estudo da eficácia da molécula no tratamento de animais infectados pelo vírus.
“Com esses resultados, vamos começar a testar em células de humanos, sobretudo as células de pulmão, órgão que o vírus ataca principalmente. Vamos verificar também se a molécula atua diretamente no vírus ou só na replicação viral. Dependendo dos resultados, iremos para os estudos in vivo, que é testar as moléculas em cobaias”, conclui.
FONTE: Por CNN BRASIL