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Número de botos mortos sobe para 178 em dois lagos do Amazonas

Mortes são registradas devido seca dos rios do estado e altas temperaturas registradas.

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Mais de 170 botos foram encontrados mortos em dois lagos do Amazonas. — Foto: WWF

O número de botos mortos subiu para 178 nos lagos de Tefé e Coari, no interior do Amazonas, segundo um levantamento feito pela ONG WWF-Brasil, nesta segunda-feira (30). Segundo a ONG, as mortes são registradas devido a seca dos rios do estado e altas temperaturas registradas.

Desde 23 de setembro, registramos 155 carcaças de botos-cor-de-rosa e tucuxis no Lago Tefé e 23 no do município vizinho, segundo a oceanógrafa Miriam Marmontel, líder do Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos Amazônicos do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM).

“É a primeira vez no mundo que o calor, a crise climática, mata mamíferos aquáticos dessa maneira. O que está acontecendo na Amazônia é equivalente ao que está ocorrendo no Ártico com morsas e ursos polares”, informou a oceanógrafa.

Dos 62 municípios do Amazonas, 60 estão em estado de emergência devido a seca dos rios, segundo a Defesa Civil. Mais de 600 mil pessoas foram prejudicadas.

“Secas e cheias extremas vão acontecer com cada vez mais frequência e intensidade. E a tendência é que a situação na região amazônica piore, pois a expectativa é de que no ano que vem o El Niño seja ainda mais forte”, disse Miriam.

Cerca de 10% da população de botos do Lago Tefé foi perdida em apenas uma semana, enquanto a média de encontro de carcaças era de uma ou duas por mês, segundo Miriam, uma das maiores especialistas do país no assunto.

Ela e outros pesquisadores ainda investigam a razão da discrepância entre as espécies mortas. Das 155 carcaças registradas no local, 84,5% são cor-de-rosa (Inia geoffrensis) e 15,5% são tucuxis (Sotalia fluviatilis), em geral os mais vulneráveis.

Miriam comentou que, no entanto, o sistema respiratório dos botos-cor-de-rosa é mais frágil.

“Então, outros fatores relacionados ao clima podem ter pesado no contexto atual. Em 28 de setembro, dia em que a temperatura da água chegou a quase 40°C na Enseada do Papucu e que documentamos 70 mortes, a qualidade do ar estava péssima devido às queimadas intensas e a umidade estava em 50%, quando neste período do ano costuma variar entre 80% e 90%”, explicou.

Estresse térmico

Ayan Fleischmann, líder do Grupo de Pesquisa em Geociências e Dinâmicas Ambientais na Amazônia do IDSM, acrescenta que a hipótese mais provável é que, em decorrência do estresse térmico, os animais pararam de se alimentar e, por isso, perderam a capacidade de regular a temperatura corporal.

“Em situações assim, a pressão sanguínea sobe e pode haver um colapso cerebral, como congestão ou derrame. Mas ainda estamos aguardando as análises de histopatologia para bater o martelo”, disse.

Conforma a WWF, isso explicaria o fato de indivíduos principalmente da espécie cor-de-rosa terem sido vistos desorientados no Lago Tefé, fazendo movimentos circulares, como se não soubessem para onde ir momentos antes de perderem a vida.

“Se o aumento da pressão sanguínea for confirmado nos exames, teremos descoberto da pior forma possível o limite de temperatura que os botos suportam. Por isso, os próximos anos nos apavoram”, completou o pesquisador.

Enseada do Papucu, um dos pontos preferidos dos botos da região pela abundância de peixes no Amazonas. — Foto: Divulgação/WWF
Enseada do Papucu, um dos pontos preferidos dos botos da região pela abundância de peixes no Amazonas. — Foto: Divulgação/WWF

Após seguidas aferições de temperatura em diferentes horários, profundidades e locais, o IDSM concluiu que a Enseada do Papucu, um dos pontos preferidos dos botos da região pela abundância de peixes, drena água de uma área bem rasa do Lago Tefé, uma vasta lâmina que está medindo apenas entre 20 e 30 centímetros de altura e que tem potencial para esquentar muito sob o sol escaldante.

Um verdadeiro caldeirão que ultrapassou os 40°C em 28 de setembro, o dia mais mortal para os animais, quando a temperatura da água bateu 39,1°C na Enseada.

“Acima do Papucu medimos quase 41°C, mas a temperatura foi baixando em seu curso até chegar a 33°C ou 32°C no Rio Solimões. Vimos que o fluxo da água foi dissipando o calor”, diz Fleischmann.

A partir do drama que se iniciou em Tefé, o IDSM criou uma rede de parceiros para monitorar outros lagos na Amazônia e já conta com pesquisadores em municípios como Manaus e Iranduba, no

Amazonas, e Santarém, no Pará. Em Coari, por exemplo, a equipe da UFAM (Universidade Federal do Amazonas), liderada pela professora Waleska Gravena, tem monitorado o lago três vezes por semana. Além disso, estão sendo instalados sensores automáticos para aferir a temperatura da água e amostras foram coletadas para análise físico-química em laboratório.

“Assim como a temperatura do ar bate recordes, a hipótese é que agora a temperatura da água também tenha batido. Das medições que temos disponíveis, nunca havíamos chegado ao patamar atual na Amazônia”, comentou Fleischmann.

Sem agentes infecciosos

Dentre os resultados documentados até o momento estão 124 animais necropsiados e amostras de tecidos e órgãos enviadas para laboratórios especializados distribuídos pelo Brasil. Dezessete foram avaliados com análises histológicas e não há indícios de agentes infecciosos relacionados como causa primária da mortalidade.

Os diagnósticos moleculares de 18 indivíduos também deram negativo para os agentes infecciosos Morbillivirus, Toxoplasma, Clostridium, Mycobacterium e Pan-fúngico, associados a mortes em massa de cetáceos.

O que o WWF-Brasil está fazendo

O WWF-Brasil tem agido em parceria com o IDSM fornecendo combustível, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), insumos veterinários e apoio logístico para o deslocamento de voluntários. Também está em contato com parceiros locais e mobilizado para apoiá-los no enfrentamento da crise humanitária causada pela seca na região amazônica, pois as consequências são especialmente dramáticas para as populações mais vulneráveis, como indígenas, quilombolas, extrativistas e

ribeirinhos. Neste momento, nossa principal frente de atuação é no fornecimento de alimentos para comunidades impactadas pelo desabastecimento.

“Na Amazônia, estamos vivendo uma seca histórica, com incêndios florestais e altas temperaturas, causada pelo aumento do desmatamento e intensificada pelo El Niño. As consequências dessa seca são graves para as populações locais e para a biodiversidade, tanto que já registramos a morte de 178 botos na região”, afirma Mariana Paschoalini Frias, analista de Conservação do WWF-Brasil e coordenadora da Iniciativa Sul-Americana dos Golfinhos Fluviais.

“Essa tragédia mostra a urgência da adoção de medidas conjuntas para a conservação da Amazônia, um bioma chave para a dinâmica climática em todo o mundo, e dos botos, espécies fundamentais para o equilíbrio ecológico e que permitem avaliar o estado de saúde dos ecossistemas em que habitam”, finalizou.

FONTE: Por G1 AM

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