Amazonas completa, no sábado (13), um ano desde primeiro caso confirmado de Covid-19. Exemplos de ajuda ao próximo, diante de colapso, foram recorrentes no estado.
Foi no dia 13 de março de 2020, há quase um ano, que o Amazonas confirmou o primeiro caso de Covid-19. Desde lá, o estado enfrentou duas ondas da doença, colapso na saúde, crise por falta de oxigênio e muitas perdas.
O cenário de caos deixou em evidência a onda de solidariedade e apoio àqueles que mais precisavam de ajuda. Se por um lado famílias sofriam com perdas de entes queridos, falta de insumos e de assistência, por outro,grupos se organizavam para oferecer ajuda aos necessitados.
Até esta quarta-feira (10), o Amazonas teve mais de 11,2 mil mortes por Covid, e mais de 326 casos confirmados. A primeira onda da pandemia foi registrada entre abril e maio do ano passado, e a segunda onda aconteceu entre janeiro e fevereiro deste ano.
O G1 voltou a falar com pessoas que realizaram boas ações durante um momento de dificuldade enfrentado por familiares de pacientes internados com a Covid-19 que precisaram de forças e acalento. Confira:
Fé e esperança durante isolamento em Manaus
Quando Manaus passou pela primeira onda da pandemia, o isolamento social foi uma medida nova para as pessoas. Se trancar em casa e sair somente para o essencial se tornou necessário. Insônia, depressão e ansiedade foram efeitos causados pela pandemia do coronavírus.
Para acalentar famílias e levar esperança durante o período de isolamento social, o músico da Igreja Católica Célio Costa chegou a realizar shows para moradores de um condomínio em Manau, em abril do ano passado. A ação foi para reforçar a necessidade de unir forças durante o isolamento social.
Célio e a esposa ficaram em uma parte isolada do prédio, e os moradores acompanharam de suas casas. Os louvores se ecoavam pela área de lazer vazia do prédio. O músico não mora no local, mas foi convidado.
Em uma nova entrevista ao G1, o músico contou que realizou outros shows, mas de forma 100% online por conta da segunda onda ter sido mais agressiva. “Eu me reservei ao direito de não sair de casa, não aceitar nenhum tipo de compromisso presencial até mesmo para não causar nenhum desrespeito aquilo que está acontecendo em nossa cidade”, contou.
Para o músico, foi uma experiência maravilhosa. Ele disse que na primeira onda, percebeu as pessoas muito assustadas. Contou que muitas pessoas entraram em depressão e outras com síndrome do pânico.
“São várias situações que não só a pandemia trouxe e acabou deixando esse resquício na vida das pessoas. E, ir aos condomínios, tocando, cantando com momentos de oração, ver as pessoas participando dos seus apartamentos, foi um momento de renovação de fé para eu mesmo. Acabei percebendo essa sede que as pessoas estavam tendo de Deus e isso foi maravilhoso”
O músico e a esposa foram infectados pela Covid-19 durante a primeira onda da doença, mas se recuperaram em casa. Ele perdeu uma irmã que foi vítima do coronavírus.
O que aprendeu com a pandemia?
“A lição de tudo isso é que a gente precisa aprender a pensar um pouco mais no próximo, o que mais nós temos visto em noticiários da nossa cidade é as pessoas fazendo festas clandestinas e desrespeitam regras. As pessoas esquecem que quando saem para se divertir, daqui um pouco ela pode estar em uma funerária chorando por um ente querido dela. Eu tenho aprendido é exatamente a respeitar o espaço do outro”, finaliza.
Força-tarefa para salvar vidas durante crise
Manaus enfrentou uma crise com a falta de oxigênio em hospitais durante a segunda onda da pandemia. O que era de responsabilidade dos órgãos de saúde, passou a ser preocupação de todos. Inúmeros artistas se mobilizaram e enviaram cilindros para capital, além disso, surgiram diversas campanhas para arrecadar doações
Famílias choraram em porta de hospitais, fizeram filas em portas de empresas de oxigênio e tiveram que comprar o insumo com o próprio dinheiro. No meio dessa correria contra o tempo, o trabalho da segurança mudou.
A delegada-geral da Polícia Civil, Emília Ferraz, contou que a força-tarefa durante o colapso foi uma necessidade. Ela disse que a corporação passou a ser procurada por pessoas que tinham interesse em fazer doações e precisavam de uma segurança adequada.
“Toda essa ação surgiu da necessidade de ajudar a população do Estado, que também é função da Secretaria de Segurança Pública: dar esse apoio também para as pessoas. Então, a força-tarefa foi tomando uma proporção maior, a questão da distribuição dos cilindros de oxigênios, doações de cestas básicas e alimentação. Tudo fruto de arrecadação”, explicou.
Entre as cenas tristes de famílias em portas de hospitais, na correria, equipes da polícia chegavam como forma de esperança em unidades de saúde com cargas de cilindros de oxigênio para abastecerem os locais e tentarem salvar vidas. O cenário se tornou comum durante dias.
“Disponibilizei todo o meu pessoal operacional, pois naquele momento, a prioridade era salvar vidas. Foram disponibilizados todos os policiais voluntários que fora do seu horário de trabalho tinham essa vontade de ajudar”, completou.
A delegada lembrou que ela e toda a equipe foram infectados pela Covid-19 e contou que o trabalho não parou desde quando a pandemia teve início no Amazonas.
“Na pandemia, a forma de ajudar foi diferente, não foi trocando tiros com bandidos ou fazendo investigação para desarticular grandes quadrilhas, mas sim poder levar o fruto de uma doação para quem estava com necessidade naquele momento para respirar”, disse.
Quando a capital atingiu o colapso, a ordem do governo foi apenas enviar efetivo para portas de hospitais e evitar alvoroço de familiares nas unidades. A categoria ainda não foi vacinada e ainda não há previsão para serem imunizados.
O que aprendeu com a pandemia?
“A lição de vida que temos que ser gratos pois tudo é passageiro. Se eu posso extrair alguma coisa dessa pandemia, é a questão da gratidão. Gratidão a Deus por cada momento com as pessoas que nos rodeiam e um olhar mais humanizado do ser humano, essa questão de que hoje você está com um, amanhã não pode. Então, dê o seu melhor todos os dias. Essa é a lição que eu tive de pessoa, da Emília, não da delegada”
‘Amar o próximo como a nós mesmos’
No dia 15 de janeiro, um dia após hospitais de Manaus sofrerem com a falta de oxigênio e pessoas morrerem pela falta do insumo, o cabo da Polícia Militar Elinay Araújo, de 33 anos, e a esposa dele, Maísa, distribuíram café da manhã para acompanhantes e profissionais da saúde na porta do hospital 28 de Agosto.
Em uma nova entrevista ao G1, ele contou que a ideia surgiu logo após assistir reportagens nos jornais e ter visto, por meio de redes sociais, as dificuldades das pessoas no Hospital 28 de Agosto.
“Muitos dos familiares estavam sem nenhum apoio do governo ou de qualquer pessoa até aquele momento. Eu e minha esposa pensamos em ajudar no que estava ao nosso alcance. O pão com presunto, nescau e café pela manhã é o que poderíamos fazer e foi o que fizemos. Graças a Deus deu tudo certo”, contou.
Depois dessa rede do bem, Araújo contou que após essa primeira ação no hospital, novas doações foram feitas. Dessa vez, com o apoio de colegas que se mobilizaram. Além do café da manhã, o casal distribuiu dezenas de marmitas e até potes com mousse de cupuaçu.
O cabo lembra que as doações de alimentos em portas de hospitais pararam pois o casal teve que ajudar uma idosa, amiga deles, de 64 anos, que estava internada com Covid-19. Eles compraram um aparelho, alimentos, remédios, além de colaborar com transporte aos familiares. A paciente ficou internada durante 20 dias no mesmo hospital, e se recuperou da doença. Todos os familiares dela foram infectados.
“Fico muito feliz. É muito gratificante [ajudar as pessoas]. Sou cristão e como um verdadeiro cristão tenho o dever de obedecer os mandamentos de Cristo que é amar o próximo como a nós mesmos. E com certeza, se o povo brasileiro tivesse mais empatia pelo próximo, se colocasse no lugar do que está sofrendo, sairíamos mais rápido dessa crise”, disse.
A esposa do policial perdeu três tios para a Covid-19. Ele contou que também perdeu vários amigos. “Em meio a todo esse caos, creio que dias melhores virão e vamos sair mais fortes, mais humanos, com mais empatia e mais humildes”, contou.
O que aprenderam nessa pandemia?
“Precisamos viver essa vida não olhando somente para nós mesmos, mas para Deus que o mundo além do nosso, isto é, para a eternidade onde todos iremos um dia após a morte e para o próximo que faz parte do nosso mundo. (…) [a vida] precisa ser olhada com mais cuidado, carinho e amor, não somente um ‘amor’ de palavras bonitas e textos belos nas redes sociais, mas de atitude e ação solidária ajudando o próximo”, finaliza.
Dog Influencer: Sarita distribuiu doações para comunidades ribeirinhas durante pandemia
E entre as boas ações feitas para a população durante a pandemia no Amazonas, também se destacou a ‘dog influencer’ Sarita – que é sucesso nas redes sociais com mais de 70 mil seguidores.
Com o dono, o dentista Guilardo Souza, conseguiram arrecadar cestas básicas com a ajuda dos ‘Sarilovers’, apelido dos seguidores do pet influenciador digital, e percorrer rios do Estado para doar os itens a moradores de comunidades ribeirinha.
Além das entregas das cestas básicas, foi feita uma outra ação em outubro, no dia das crianças com entregas de brinquedos, máscaras e comida. Neste mesmo mês, outra ação foi feita com os animais do município do Careiro Castanho que vivem abandonados nas ruas com distribuição de 500 Kg de ração.
“Faríamos de novo sim,, pois é muito gratificante ajudar quem precisa. Penso que é só nos colocarmos no lugar do outro, não ter o que comer dói, não poder dar um brinquedo para seus filhos dói. É tudo uma questão de empatia pelo próximo e se não sairmos da nossa zona de conforto nada é feito”, disse o dono da Sarita.
O dono da dog influencer contou que houve dificuldades nas arrecadações para doações pois a maioria das pessoas que ajudaram a causa eram de outros estados do país, queriam doar os alimentos e ração e não tinha como mandar. Persistiram e conseguiram. “Quando queremos algo não podemos desistir no primeiro não que recebemos”.
O que aprenderam nessa pandemia?
“Aprendemos que devemos demonstrar o amor e carinho pelas pessoas que amamos sempre, pois essa vida é um sopro. A mensagem que fica é que por mais que nossa ajuda ao próximo seja pequena e não mude o mundo, vale muito a pena melhorar pelo menos um pouquinho a vida de alguém”, finaliza.
FONTE: Eliana Nascimento, G1 AM