Início Destaques “Parcelado sem juros” esconde custo, mas é importante para a economia, dizem...

“Parcelado sem juros” esconde custo, mas é importante para a economia, dizem especialistas

Banco Central disse que poderia pensar em maneiras de restringir o uso da modalidade como forma de evitar a inadimplência e combater os altos juros do rotativo do cartão de crédito

0
Banco Central disse que poderia pensar em maneiras de restringir o uso da modalidade como forma de evitar a inadimplência e combater os altos juros do rotativo do cartão de crédito

O parcelamento sem juros, que entrou na mira do Banco Central em uma cruzada para reduzir os juros do cartão de crédito, é não só uma modalidade tipicamente brasileira como também uma espécie de ficção na qual todos resolveram acreditar, de acordo com especialistas do mercado de crédito consultados pela CNN.

“Não existe almoço grátis. O comércio tem custos com isso e eles estão embutidos no preço”, diz o coordenador do Instituto de Finanças da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), Ahmed El Khatib.

Ainda assim, os especialistas concordam que o “parcelado sem juros” já se tornou peça fundamental tanto na receita do comércio quanto no orçamento dos consumidores, se não na cultura financeira brasileira como um todo, e combate-lo traria consequências piores.

“Se não tiver essa estratégia de parcelamento, não vai ter consumo”, complementa Khatib. “O parcelamento sem juros é usado pelas lojas para impulsionar as vendas e permite que o consumidor, normalmente de baixa renda, adquira as coisas sem comprometer seu orçamento familiar. Extingui-lo afetaria a sustentabilidade de diversos comerciantes pelo país, o que é ruim para a economia como um todo.”

Juros de mais de 400%

Em declarações recentes, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse que o governo deve pensar em medidas para desestimular o uso irrestrito do “parcelado sem juros”.

No diagnóstico de Campos Neto, o uso disseminado dos longos parcelamentos acaba amplificando o uso do cartão de crédito e, com ele, do crédito rotativo do cartão, modalidade com as maiores taxas de inadimplência e de juros do país.

A taxa do rotativo, aplicada sobre aqueles que deixam de pagar a fatura do cartão em dia, é atualmente de cerca de 15% ao mês, em média, e passa dos 400% em um ano, de acordo com os dados do BC.

A sugestão, entretanto, foi prontamente criticada por entidades do comércio, serviços, empreendedorismo e também das emissores de cartões, além de relativizada pelo próprio governo depois da repercussão.

Os varejistas argumentam que o parcelado sem juros “não só funciona como uma alavanca do valor médio das transações como também aprimora, significativamente, a administração do estoque”, e sua extinção “pode prejudicar milhares de negócios, em especial os micro e pequenos”, de acordo com uma nota da FecomercioSP.

A FecomercioSP é a federação que representa empresas do comércio, serviços e turismo do estado de São Paulo.

Os bancos, por sua vez, embora também reconheçam a importância da modalidade para a economia, defendem que ela traz distorções e merece ser revisada.

“O prazo de financiamento impacta diretamente no custo de capital e no risco de crédito, e a inadimplência das compras parceladas em longo prazo é bem maior do que na modalidade à vista”, disse a Febraban, federação que representa os bancos, em nota sobre o tema.

Efeito psicológico

O economista Claudio Felisoni, professor da FIA Business School e também presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo (Ibevar), explica que o parcelamento sem juros faz parte do que a economia e o marketing chamam de “precificação psicológica”.

“As pessoas ancoram seu processo decisório em determinados atalhos que não necessariamente são racionais”, explica Felisoni.

É o mesmo balaio em que estão recursos como os centavos quebrados (R$ 9,99 em lugar de R$ 10) e promoções como “leve 2, pague 3”. Eles induzem o consumidor à percepção de que está tendo um benefício, mesmo que, na prática, ele não exista ou seja pequeno.

“O ideal seria ficar mais claro para o consumidor o quanto ele efetivamente está pagando, dando, por exemplo, o desconto para quem quer pagar à vista”, diz o professor da FIA.

“O problema é que o varejo está em um momento desfavorável de vendas, com uma retomada bem fraca a partir do começo deste ano. E é evidente que mexer nessa forma de financiamento traria um impacto adicional a uma situação que já é bastante frágil.”

A coordenadora do programa de serviços financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, Ione Amorim, defende que é necessário que sejam feitos estudos aprofundados sobre quem são as pessoas que utilizam os parcelamentos sem juros e que, principalmente, acabam depois presas nos juros exorbitantes do rotativo do cartão de crédito.

“O problema é mais profundo. Quem entra no rotativo?”, diz ela.

“Nós não sabemos, mas presumimos que são as famílias de menor renda e que precisam do cartão de crédito para complementar despesas básicas. Precisamos saber quem é esse usuário e, daí, tirar as melhores políticas públicas, sem contaminar todo o ambiente de negócios.”

Para Ione, “o parcelado sem juros não precisa acabar”. Ela entende que é um arranjo que já está “incorporado na rotina das famílias”.

“Mas é importante pensar que, se a pessoa puder pagar a vista, e conseguir um bom desconto, é sempre a melhor opção”, diz ela.

“Se não tiver a disponibilidade do recurso imediato, tem que entender que o parcelamento compromete a renda da família por vários meses e exige disciplina. Se não for dar conta, nem use.”

FONTE: Por CNN

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui