O assessor especial para assuntos internacionais da presidência e ex-chanceler Celso Amorim deixou Paris nesta segunda-feira (9), fazendo uma escala na Polônia, para partir à Ucrânia para o encontro com o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky em Kiev, nesta quarta-feira (10).
O objetivo principal da conversa será falar sobre o “clube da paz” proposto pelo governo Lula para encerrar a guerra entre Rússia e Ucrânia.
Segundo interlocutores de Amorim, a ideia do clube é reunir países que não estão diretamente envolvidos no conflito, mas que são grandes potências e têm visões consideradas relevantes nas discussões em âmbito global.
O ex-chancelar quer iniciar um diálogo, sem partir de um plano já estruturado. O governo busca evitar, inicialmente, tocar em pontos que Ucrânia e Rússia não abrem mão para não inviabilizar a conversa logo de cara. Não seria um plano com começo, meio e fim, que já apresenta saídas. Na visão do ex-chanceler, a partir do momento em que todos se sentarem à mesa, as soluções podem aparecer.
Mas a missão não será simples. A devolução dos territórios ocupados pelos russos, um dos principais pontos de discordância entre Moscou e Kiev nas conversas sobre planos de paz, não deve ser colocada em questão. Zelensky rejeita conversas sobre paz que não envolvam a retirada das tropas russas de territórios ocupados na Ucrânia.
No plano de paz de 12 pontos proposto pela China, por exemplo, Pequim defendeu a integridade territorial da Ucrânia, mas não explicitou o que aconteceria com os territórios tomados pelos russos. Na ocasião, Zelensky reconheceu a iniciativa chinesa, mas deixou claro que não vai abrir mão da retirada dos territórios ocupados.
Fontes do governo afirmam que a ida de Amorim à Ucrânia acontece neste momento para que Lula faça um aceno ao Ocidente antes de ir ao encontro do G7. A reunião do grupo que reúne os países mais industrializados do mundo vai acontecer em Hiroshima, no Japão, entre os dias 19 a 21 de maio.
Viagem acontece após críticas sobre proximidade com a Rússia
Amorim vai visitar a Ucrânia depois que o governo brasileiro foi criticado por falas e encontros vistos como sinais de aproximação com os russos. Primeiro, Amorim visitou a Rússia em 29 de março, onde se encontrou com Putin, em uma viagem que não foi divulgada previamente à imprensa. Depois, vieram as falas de Lula em 16 de abril, em viagem aos Emirados Árabes Unidos, quando o presidente disse que nem Rússia, nem Ucrânia querem a paz e Europa e os Estados Unidos contribuem para a continuidade da guerra. Por fim, Lula recebeu o chanceler russo em Brasília no dia 17 de abril.
Após os episódios, o governo Lula confirmou que Amorim iria à Ucrânia para falar sobre seu plano de paz. A confirmação aconteceu durante a viagem de Lula a Portugal e Espanha, quando o presidente moderou o discurso sobre a guerra perante os líderes europeus.
Brasil como mediador da paz
Ainda que haja um ceticismo, mesmo dentro do governo, sobre a capacidade de Lula de encerrar o conflito, fontes do Planalto falam que a estratégia do governo é ganhar relevância no cenário global ao se colocar como um mediador da paz – e isso já estaria acontecendo, já que o Brasil passou a ser incluído nas discussões internacionais sobre a guerra.
Vicente Ferraro, cientista político e pesquisador de política da Rússia e Ucrânia, afirma que a visita à Ucrânia é fundamental para que o Brasil consiga se posicionar eventualmente como um mediador no conflito. “O Brasil deve se abster de discursos, alinhados ao Kremlin, de que essa é uma guerra apenas entre a Rússia e o Ocidente, ignorando o papel e posicionamento da Ucrânia”, afirma.
Para que as negociações tenham alguma possibilidade de sucesso, prossegue o professor, o Brasil não deveria tornar o seu conteúdo público. Ele também acredita que uma negociação plausível poderia incluir a devolução de alguns territórios pela Rússia e o reconhecimento de outros pela Ucrânia, mas avalia que nenhuma negociação vai ser totalmente justa para a Ucrânia.
“A Ucrânia está em uma luta para alcançar a negociação menos injusta possível. Há uma percepção de que o país ainda tem fôlego para recuperar territórios, com os armamentos estrangeiros, aumentando a margem de manobras para negociações. Mas se a Rússia conquistar mais territórios, a Ucrânia será forçada a aceitar acordos mais injustos. O que está em jogo é uma questão normativa-moral de como e quando alcançar a menor injustiça”, diz Ferraro.
FONTE: Por CNN